quarta-feira, 17 de outubro de 2012

POLÍTICA: A gasparização do país


Às vezes o «jornalismo de sarjeta» faz serviço público sem disso se dar conta. E dentro da lama, que costuma espalhar à sua volta, acaba por revelar algumas situações a merecerem atenção aos que pugnam por um jornalismo de referência e ali detetam realidades pouco evidentes, mas com uma pertinência acutilante. Foi o que se passou com uma notícia de hoje do «Correio da Manhã», que dava conta da recusa de uma escola pública algarvia em servir almoços na cantina às crianças cuja mensalidade não fora paga pelos respetivos progenitores.
À noite um telejornal investigava mais a fundo a questão e ficava-se a saber pela responsável da escola em causa que decidira segregar uma menina de cinco anos pondo-a em sala à parte enquanto os colegas tomavam a refeição.
Incomodada com a súbita atenção dos media a professora autoelogiava-se pela compaixão (!!!) demonstrada para com a criança a quem não se deixara passar completamente fome, já que lhe fora distribuído um pão e leite.
Mas poderemos imaginar o trauma causado na menina pela atitude só pensada em função do não cumprimento das metas financeiras a que a escola está obrigada perante o Ministério da Educação? O que terá sentido a visada, quando a auxiliar a terá mandado sair da fila para o refeitório, encaminhando-a para uma sala vazia aonde suportaria a longa hora do almoço? Decerto que uma humilhação de que jamais se conseguirá apartar!
O que o caso revela é a extrema violência para com a criança, que se tornou vítima dos critérios da direção escolar para a qual o volume da dívida dos pais é mais relevante do que o atentado à sua psique.
É esta a (falta de) cultura que o governo de Passos Coelho e Vitor Gaspar está a impor aos portugueses numa lógica de «salve-se quem puder. Em vez de os tratarem como pessoas - com direitos, necessidades e sentimentos - vêem-nos como meros números na tão glosada folha de excel.
Na entrevista a autora material do crime insurgia-se contra a falta de cumprimento dos progenitores quanto ao pagamento da alimentação dos filhos. Mas, quando um pai ou uma mãe faltam a esses deveres, é porque já estão tão despojados de meios económicos, que não sobra sequer para aquilo que quase todos consideram prioritário: a satisfação das necessidades básicas dos filhos.
O que este exemplo revela é a desumanização social, que torna imperativo o advento de uma sociedade diferente, mais justa e humana...

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