terça-feira, 29 de janeiro de 2013

POLÍTICA: A Europa ou o Caos? (2)


Concluímos aqui a tradução pessoal do manifesto «A Europa ou o Caos?» subscrito por vários intelectuais europeus apostados em pensarem o estado atual da Europa e o dilema que para ela se coloca: prosseguir nesta rota de decadência e de morte ou a regeneração dos princípios para ela pensados pelos seus fundadores.
Porque se trata de um documento, que está a suscitar debates a que não nos devemos alhear, justifica-se a sua inserção neste contexto.
Tínhamos ficado nos sintomas de crise, que estão a destruir uma certa ideia de Europa.
Ela vai-se perdendo em Roma, o seu outro berço, o seu outro esteio, a segunda matriz (sendo a terceira a ideia de Jerusalém). O da sua moral e dos seus saberes, o outro espaço da invenção da distinção entre a lei e o direito, ou entre o homem e o cidadão, que está na origem do modelo democrático que tanto trouxe, quer á Europa, quer ao próprio mundo. Essa fonte romana poluída pelos venenos de um berlusconismo que tarda em desaparecer. Essa capital espiritual e cultural, por vezes englobada, a par da Espanha, de Portugal, da Grécia e da Irlanda, nos famosos «PIIGS», fustigados sem consciência nem memória pelas instituições financeiras. Esse país que inventou o embelezamento do mundo na Europa e que assume o aspeto, com razão ou não, de homem doente do continente - que miséria! que absurdo!
Essa ideia de perda ocorre por todo o lado, do ocidente ao leste, do sul ao norte, com o crescimento dos populismos, dos chauvinismos, dessas ideologias de exclusão e de ódio que a Europa deveria precisamente marginalizar, arrefecer, e que levantam vergonhosamente a cabeça: como estamos distantes do tempo em que as ruas de França se enchiam em solidariedade com um estudante insultado por um chefe partidário de memória escassa, ele mesmo que antes dissera «nós somos todos judeus alemães!». Como parecem distantes esses movimentos de solidariedade em Londres, Berlim, Roma ou Paris com os dissidentes dessa outra Europa, que Milan Kundera designava como a «Europa cativa» e que surgia como o coração da Europa! E quanto à pequena Internacional dos espíritos livres, que lutavam há vinte anos, por essa alma europeia encarnada na Sarajevo bombardeada, vítima de uma «limpeza étnica» impiedosa, aonde está agora e porque não se deixa ouvir?
E a Europa também se desfaz por causa dessa interminável crise do euro, que todos percebemos não estar controlada.
Será que essa moeda única e abstrata não é mais do que uma quimera, já que não corresponde às economias, aos recursos, às fiscalidades convergentes?
As moedas únicas, que se revelaram bem sucedidas (o marco a partir do zollverein, a lira da unidade italiana, o franco suíço, o dólar) não foram as que se apoiaram num projeto político comum? Não existe uma regra incontornável pela qual se demonstra que a existência de uma moeda única pressupõe um mínimo de orçamento, de normas contabilísticas, de princípios de investimento, em suma de políticas partilhadas?
O teorema é implacável: sem federação não há moeda que aguente!
Sem unidade política a moeda pode durar algumas décadas, mas uma guerra ou uma crise desagrega-a. Sem progresso nessa integração política, cuja obrigatoriedade está inscrita nos tratados europeus mas que nenhum responsável parece querer avançar sem o abandono de competências pelos Estados-nações e sem uma franca derrota desses «soberanistas», que empurram os povos para o fechamento em si mesmos e para a decadência, o euro desintegrar-se-á como teria sucedido ao dólar se, há 150 anos, os sulistas tivessem vencido a guerra da Secessão.
Dantes dizia-se: socialismo ou barbárie. Hoje é preciso dizer: união política ou barbárie!
Melhor: federalismo ou dissolução, e na sua eventualidade, regressão social, precariedade, explosão do desemprego, miséria.
Melhor: ou a Europa dá um passo em frente, mas decisivo na via da integração política, ou sai da História e condena-se ao caos.
Não temos escolha: é a união política ou a morte.  Que poderá assumir múltiplas formas e dar sucessivas reviravoltas. Pode demorar dois, três, cinco, dez anos e ser precedida de numerosas remissões, sempre a iludir que, de cada vez, o pior tenha sido conjurado.
Mas virá. A Europa sairá da História se nada se alterar.
Não se trata de uma hipótese, de um receio vago, de um trapo vermelho agitado na cara dos europeus recalcitrantes.
É uma certeza. Um horizonte inultrapassável e fatal. Tudo o que restar - deslumbramentos para uns, adaptações para outros, fundos de solidariedade para uns, bancos de estabilização para outros - não resultará senão no adiamento do fracasso capaz de dar ao moribundo uma ilusão de tréguas.

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