domingo, 7 de abril de 2013

FILME: «César Deve Morrer» de Paolo e Vittorio Taviani


Dos realizadores italianos vivos, os irmãos Taviani são, decerto, aqueles que sempre me suscitaram uma expectativa maior em relação às suas propostas criativas. E «César Deve Morrer» não desmerece de  uma filmografia que, sobretudo na décadas de 70, integra títulos memoráveis como «São Miguel Tinha um Galo», «Allonsanfan» ou «Padre Padrone», ideologicamente bastante mais explícitos do que eles viriam depois a assumir.
Desta feita os realizadores asseguram uma espécie de making of de uma encenação teatral preparada numa cadeia de alta segurança dos arredores de Roma, e onde gente aprisionada por homicídios, tráfico de droga e ligações mafiosas, vestem a pele de Bruto, Júlio César, Cássio e demais personagens da tragédia de Shakespeare e a transformam ao mesmo tempo num notável trabalho cénico e numa experiência de vida, que os confronta com as suas próprias experiências pessoais. É fascinante verificar a evolução dos atores desde a fase de insipiência no domínio das técnicas de representação até ao apuro subsequente resultante de muito esforço e determinação. Assim como não deixa de ser igualmente interessante o confronto íntimo desses homens de passado muito complicado com um texto literário com o qual estabelecem pontes de identificação e de aprofundamento da consciência de si mesmos.
Estamos, é claro, na Itália berlusconiana, que não enjeita a herança dos valores do fascismo mussoliniano, e em que esta história de quem arrisca a pele para obstar a uma ditadura em processo de afirmação (a de Júlio César) e não consegue evitar outra, que lhe herda a ambição e a prepotência (a de Octávio), ganha particular ressonância até por se colocarem questões fundamentais e intemporais como o são a lealdade, a traição, a manipulação das vontades coletivas e as expetativas perante um futuro condicionado pelas grilhetas  a que se está sujeito.
Acresce, enfim, a opção entre o preto e branco dos ensaios com a cor na representação para o público. Como se aquelas imagens correspondessem ao esboço do que fica como produto final.
Esteticamente e tematicamente o filme dos Taviani tem, pois, tudo para suscitar-nos uma empatia e perdurar como experiência cinéfila bastante diferente da que normalmente nos é concedido viver.




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