quinta-feira, 19 de setembro de 2013

POLÍTICA: algumas estratégias irracionais da esquerda

Às vezes até para os mais complacentes dos seus apoiantes é difícil aceitar as opções estratégicas de algumas forças de esquerda. Se quiséssemos regressar a um par de anos atrás seria forçoso abordar a posição do PCP e do BE relativamente ao Governo de José Sócrates, quando tudo fizeram para o derrubar, questionando-se a posteriori quais as vantagens retiradas de tanta violência verbal até apoiarem o chumbo do PEC IV.
Mas as semanas mais recentes têm demonstrado que, aqui e em França, a esquerda continua sem aprender com os erros e a optar por autênticos tiros no pé, quando se trata de impor o que considera o politicamente correto.
Cá dentro é pertinente questionar sobre que vantagens conseguiu o BE com a singular polémica em torno do piropo a não ser a de centralizar em torno de si um certo anedotário político.
Não é que devamos aprovar essa expressão de um marialvismo lusitano, que chega a atingir dimensões repugnantes de trogloditismo mental, mas passa pela cabeça de alguém a possibilidade de evitar esse fenómeno através da penalização dos seus autores? Ou, pelo contrário, nessa e noutras questões, que têm a ver com o comportamento cívico dos portugueses, a melhor resposta não será a de pugnar por uma melhor e mais extensa educação através da escola pública?
Por outras palavras, quem avançou com a questão da eventual ilegalização do piropo deveria concentrar baterias na urgência em combater e derrotar a estratégia de nuno crato para o setor, que tutela.
Mas ainda estava o BE a apagar os efeitos da chamuscadela autoflagelada por algumas militantes e já o Partido Socialista francês avançava com outra questão fraturante no domínio da sexualidade: o combate à prostituição mediante a penalização dos clientes das mulheres dedicadas a venderem o uso do seu próprio corpo.
Também nesta questão, quem é de esquerda não pode manifestar maior acordo com os argumentos das deputadas socialistas, que lançaram o debate no parlamento francês.
Sim, a prostituição é aviltante para a condição feminina e alimenta as tenebrosas redes de tráfico humano.  Mas num país aonde as sondagens dão 3/4 dos inquiridos como favoráveis à reabertura dos bordéis, o governo de Hollande arrisca-se a ficar ainda mais isolado do que já está em termos de opinião pública. Porque esta não terá dúvidas em apoiar medidas mais rigorosas de penalização do proxenetismo e do tráfico de seres humanos, mas já apresentará sérias reservas em condenar quem contratualizou um ato sexual com outra pessoa, havendo, de uma e de outra parte, a aceitação das condições em que o mesmo se concretiza.
Uma vez mais a assumpção de um discurso feminista radical tende a criar inimigos a uma causa aonde seria fundamental ganhar maior número de apoiantes. Porque, como defendia a líder de uma associação representativa de prostitutas, no debate televisivo com uma das deputadas proponentes do projeto de lei, o combate a esse fenómeno não se consegue com a criminalização de clientes ou das prostitutas, mas conseguindo alterar uma das maiores causas porque muitas mulheres são obrigadas a recorrer a esta forma de obtenção de rendimentos: o desemprego.
A exemplo da questão do piropo, a esquerda não deve dispersar energias em lutas mal compreendidas pela opinião pública, devendo concentrar-se na melhor estratégia de a convocar para o apoio a medidas concretas de justiça social e de promoção das políticas tendentes a reduzirem o desemprego a realidade residual.
Estranhamente os estrategas de alguma esquerda andam esquecidos de muitas das lições, que deveriam ter bem presentes quando definem os eixos fundamentais da sua ação política, e já rastreadas por muitos e bons ideólogos a começar por Maquiavel.


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