quarta-feira, 16 de outubro de 2013

LIVRO: «Matadouro 5» de Kurt Vonnegut

Em 1969 era publicado este que é decerto um dos melhores romances de Kut Vonnegut.
Matadouro 5 era precisamente onde estava encarcerado o autor, quando era prisioneiro de guerra em Dresden. E foi do seu interior, que saiu para a luz do dia, quando ocorreram os célebres bombardeamentos da cidade em fevereiro de 1945, que a deixaram totalmente destruída.
Dessa terrível experiência, Vonnegut retirou uma história curta, caótica, fragmentada, porque, segundo o autor, “não há nada de inteligente a contar sobre um massacre”.
E, no entanto, resulta óbvio o quanto corresponde a uma estratégia estilística e emotiva essa opção pelo caos e pelos fragmentos.
Billy Pilgrim, o protagonista do romance, sobreviveu acidentalmente aos bombardeamentos e sente-se descolado do seu tempo, vendo e revendo repetitivamente as sequências essenciais da sua vida. Os traumas da memória estiveram na origem de uma personalidade perturbada, assombrada pelas imagens da torrente de fogo e de sangue.
O romance conta então o sucedido na vida de Billy sem preocupação cronológica, através de pedaços dispersos e repetitivos.
Se num dado momento Billy está sentado no escritório ou em casa, no minuto seguinte vê-se regressado a Dresden.
A viagem no tempo, também alterna com a que efetua pelo espaço, porque visita igualmente o distante planeta Tralfamadore.
O leitor mergulha assim num romance, que tanto pode ser de memórias como de ficção científica, a menos que opte por uma interpretação mais racional, que o leve a considerar-se perante os delírios catárticos de um personagem, que tenta proteger-se da experiência terrível da guerra.
O romance avança segundo dois planos: a guerra com o bombardeamento de Dresden e as curiosas sequências trasfalmadorianas, que vão servir de comentário à outra narrativa.
De um lado, o livro condena o horror insensato das guerras, enquanto no outro, os habitantes desse longínquo planeta afirmam tratar-se tudo de uma ridícula ilusão do terráqueo.
Na realidade, segundo eles, ninguém morre verdadeiramente, porque vive sempre num determinado plano de espaço-tempo,
Vonnegut, que comenta a história, e Billy Pilgrim, procuram encontrar um sentido para o mundo e para a humanidade. Se os homens estão, de qualquer forma, a caminho do matadouro, porque é que alguns tratam de enviar os outros mais rapidamente para essa direção? Que explicações podem ter todos os absurdos da História?
Nenhuma, insistem os extraterrestres que, na sua curta e lenitiva sabedoria tralfamadoriana respondem a tudo com uma fórmula lapidar: “É assim”.
E quando Billy insiste: “E porquê eu?”, os seus anfitriões repetem incessantemente: “Eis uma pergunta bem terráquea… Porque é que tem de saber? Porque é este o momento … não há qualquer porque!”
Eis-nos, pois, confrontados com a gratuita tragédia de ser e de morrer.


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