segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

No rescaldo das emoções

Acabámos uma semana de muitas emoções por causa do sucedido em Paris. Nunca tinha passado tantas horas no canal France 24 para acompanhar, em primeira mão, a perseguição aos irmãos Kouachi, esperando um desiderato qualquer, que permitisse voltar às rotinas do dia-a-dia com a serenidade de quem não tem estímulo mais pertinente com que distribuir a atenção.
Não é que viesse a fazer diferença em relação ao conjunto de caricaturistas merecedores do nosso respeito e admiração, definitivamente silenciados, mas porque, a exemplo do sucedido com o 11 de setembro de 2001, adivinhavam-se sinais de mudança  nos nossos destinos europeus.
E, agora, ao iniciar-se uma nova semana e ainda no rescaldo da megamanifestação de Paris, talvez me mostre demasiado otimista ao prever a possibilidade de tal demonstração de defesa de alguns dos princípios fundamentais da nossa civilização vir a criar uma dinâmica capaz de redirecionar muitos dos caminhos políticos e sociais, que parecíamos condenados a trilhar, para trilhos bem mais consistentes.
À partida os próximos tempos irão responder a duas questões basilares:
- o ataque ao «Charlie Hebdo» corresponde a um aumento significativo da atividade do terrorismo islâmico, ou, pelo contrário, a um dobre de finados da  bárbara perversão prestes a ruir com sucessivas derrotas na Síria e no Iraque? Será possível que alguns dos seus alucinados se comecem a questionar sobre a sua vocação para mártires?
- terão razão os comentadores, que vendo marine le pen cavalgar oportunisticamente a onda de indignação causada por estes crimes, preveem uma vitória inevitável nas próximas presidenciais? Ou, pelo contrário, os últimos dias terão marcado a viragem nas percentagens de apreciação dos socialistas franceses, que se mostraram afinal tão eficientes a resolver este assunto em poucos dias?
Quero crer no crepúsculo acelerado do fanatismo islâmico, sobretudo se os países ocidentais investigarem a fundo o financiamento das atividades por ele alimentadas. Uma pressão persuasiva sobre os regimes do Qatar e da Arábia Saudita poderá ter resultados práticos muito palpáveis no futuro deste fenómeno repulsivo.
E também quero crer numa recuperação eleitoral de François Hollande e dos socialistas franceses de forma a impedirem o acesso da direita e da extrema-direita ao poder. É certo que Manuel Valls diz e faz coisas, que irritam quem do socialismo tem uma perspetiva  mais conforme com a sua História, mas quem sabe se as fortes experiências desta semana o iluminem com  doses acrescidas de sagacidade.
Mas esta semana também foi de clarificação entre dois campos inconciliáveis: os que se puseram incondicionalmente do lado do «Charlie Hebdo» e os que  quiseram ser «originais», condenando-o em nome do «mau gosto» de algumas das suas caricaturas.
Pessoalmente e, desde o primeiro momento, revi-me na posição de Salman Rushdie, que disse: “Ponho-me do lado do Charlie Hebdo, como é dever de todos, para defender a arte da sátira, que foi desde sempre uma força da liberdade contra a tirania, desonestidade e estupidez”.
Aos detratores restou-me invetivá-los com  o «Shame on you!»

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