segunda-feira, 22 de junho de 2015

Ateu, graças aos deuses...

Tenho uma profunda admiração pela pessoa e pela obra de José Saramago. No dia em que o vi galardoado com o Prémio Nobel vivi uma das (felizmente muitas!) alegrias da minha vida. Por isso vêm-me, amiúde, à memória as suas palavras, quer lidas nos seus livros, quer escutadas nas suas entrevistas.
Um dos temas em que sinto uma grande identidade com o que ele pensava é no capítulo da religião. Ateu por convicção - e, sobretudo, devido à falta de provas evidentes dos pressupostos espirituais em que assentam os diversos credos - acredito profundamente que a humanidade viveria muito melhor se, em vez de semearem o ódio em nome dos seus perigosos deuses, os homens e as mulheres deste mundo apostassem na defesa intransigente do bem comum, dos direitos essenciais devidos a todos os seus iguais e começassem por pôr em causa a lógica predadora em que assenta o regime económico que nos oprime.
Quando vejo a reportagem televisiva sobre a reunião anual das Testemunhas de Jeová no Estádio do Restelo começo por relativizar a importância de ver tanta gente alienada em algo de tão pueril. A dar vontade de lhes mandar aquela divertidíssima personagem inventada pelo Nuno Markl para Nuno Lopes a interpretar na série «Os Contemporâneos», em que um «Chato» mandava os outros trabalhar.
Dir-me-á a consciência interior: é gente que não faz mal a ninguém e usa o seu direito à liberdade de crer no que acredita.
Certo? Mas, quando se pensa que toda essa gente é capaz de deixar morrer um filho, um progenitor, um conjugue, só porque proíbe os serviços médicos de lhes aplicarem a transfusão de sangue, que lhes poderia salvar a vida, começamos a compreender o quão perigosos podem ser.
Não o serão na mesma dimensão dos católicos, que queimavam judeus nas fogueiras da Inquisição ou dos jiadistas orgulhosos dos pescoços cortados em frente às câmaras, mas não deixam de implicar o seu rol de vítimas mortais.
Olhe-se para todo o planeta e são muitos os países europeus, africanos e asiáticos onde é particularmente perigoso não integrar a religião dominante. E é terrível o efeito devastador do proselitismo de certos fanáticos - que se designam como «missionários» ou «pregadores» - que envenenam as consciências alheias e as fazem tomar propósitos assassinos até então em si desconhecidos.
Um bom exemplo deste perigo verifica-se no Uganda onde três norte-americanos ligados à sua mais reacionária direita religiosa foram proferir dezenas de conferências, que estão a ter um profundo impacto no agravamento da legislação contra a homossexualidade, fazendo com que qualquer réu a quem seja imputada tal acusação tenha por sentença certa a condenação à morte. Um deles, Scott Lively é o autor de um vómito em forma de livro («The Pink Swastika») em que atribui aos homossexuais a invenção do nazismo e dos seus atos mais atrozes.
Sei que é utópico, mas espero ver alcançado um patamar civilizacional onde a superstição - religiosa ou esotérica - tenha sido reduzida à sua dimensão anedótica...

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