quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Um escândalo que não tem fim

No programa «O Outro Lado» (RTP3) o comentador Pedro Adão e Silva sugeria que uma das duas possibilidades para o teor da entrevista da semana passada com Carlos Alexandre era a vontade deste em ser afastado do processo, razão para ter avançado com as duas frases, que serviriam de fundamento aos advogados de José Sócrates para lhe conseguirem precisamente esse resultado.
A outra hipótese, que não exclui necessariamente aquela, é a de salvaguardar no imaginário coletivo a «culpabilidade moral» do antigo primeiro-ministro, perante a forte probabilidade de não haver qualquer matéria de facto para o levar a julgamento.
A notícia de mais adiamento da conclusão do processo, com a apresentação das provas acusatórias ou o seu lapidar arquivo por falta delas, condiz com o que se espera de uma Procuradora nomeada por Cavaco Silva e Passos Coelho para garantir a prossecução de uma estratégia, que levaria ao lançamento da inqualificável Operação Marquês. Mas, apesar desta notícia quase furtivamente dada em rodapé, tenho dúvidas quanto às vantagens de dar a Carlos Alexandre aquilo que possa ter estado nas suas intenções, quando garantiu a mediática peça jornalística à SIC.
Sabemo-lo incapaz da isenção e da probidade exigíveis a um juiz, mas a forte probabilidade dele ter querido usar a esperteza saloia (pelos vistos à moda de Mação!) para saltar de um navio a meter água por todos os lados, e garantir páginas e páginas de autovitimização no «Correio da Manhã» para ver se pega a imagem do «incorruptível», injustamente afastado desse dossier, quando estaria quase a confirmar a culpabilidade de José Sócrates, é hipótese que devemos considerar.
Não será fútil a formulação da possibilidade de se instalar no pasquim da Cofina e até no semanário de Balsemão a narrativa insidiosamente sugerida de que, apesar de ter escapado à Justiça, José Sócrates só o terá conseguido porque interesses mais altos (o Conselho da Magistratura ou o próprio governo) terão cuidado de eliminar do processo aquele que lhe daria outro final. Assim os Rosários Teixeiras poderão sempre alegar que tinham no anterior juiz de instrução a colaboração, que não poderiam ter com o que lhe suceda, até pela falta de tempo deste último para se inteirar do processo.
É esta a razão, porque nem alinho na indignação dos que se escandalizam com o silêncio do governo nesta matéria, nem desejo que o Conselho Superior da Magistratura force a saída de Carlos Alexandre do TIC de Lisboa. É que as minas estão colocadas para rebentar sob os pés de quem for a direito e não sopesar nas armadilhas, que a concertação de vários interesses para derrubar Sócrates estabeleceu entre os órgãos judiciais, os meios de comunicação e os interesses privados, que lhes estão por trás.
Sei que custa ver o antigo primeiro-ministro neste processo kafkiano por mais meio ano, mas a  bomba deve rebentar nas mãos dos seus autores, acabando por reconhecer que têm uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma.
Será então a altura adequada para auditar aprofundadamente os comportamentos e as práticas dos que têm liderado esta escandalosa prática do arbítrio judicial...

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