quinta-feira, 30 de março de 2017

A falácia sobre o quase pleno emprego no Reino Unido ou na Alemanha



 No Reino Unido e na Alemanha a taxa de desemprego é inferior a 6%, quase se podendo dizer próxima do pleno emprego. Ao contrário, em Portugal, França ou Itália ela é de 10%, chegando-se a 20% aqui ao lado, em Espanha. A diferença tem, porém, um preço: o “pleno emprego” rima quase sempre com flexibilidade e pauperização de quem trabalha, sinónimos de precarização e perda de produtividade.
Na Inglaterra a opção dos mais pobres pelo brexit resultou da crença de ser a União Europeia a culpada por, desde 2008, 75% dos empregos criados terem sido a termo certo e o rendimento médio decrescer 12%. Trabalhar deixou de significar a pertença ao antigo estatuto de classe média, mesmo que baixa.
Há, porém, quem comece a questionar-se se é necessária tanta flexibilidade: vendo que os seus melhores colaboradores saíam com a mesma facilidade com que eram contratados, algumas empresas começam a sentir a necessidade de os aumentar. Os resultados não demoram a constatar-se: melhor produtividade e assiduidade, resultados mais interessantes na gestão operacional ao final do ano. Mas seis milhões de pessoas ainda são pagas abaixo do “living wage”, ou seja do mínimo expectável para conseguirem satisfazer as suas necessidades básicas.
Stewart Lansley, professor da Universidade de Bristol, defende que a excessiva flexibilidade no mercado do trabalho foi responsável pelo enfraquecimento da economia inglesa nos anos mais recentes, com a descida da produtividade (nunca foi tão baixa desde 1991!) e do número de novas empresas criadas num mercado supostamente favorável ao seu florescimento. A redução dos rendimentos de quem trabalha também teve efeito nocivo no consumo interno com o que isso contribuiu para arrefecer a economia.
Na Alemanha muitos dos que trabalham em empregos mal pagos, têm de recorrer aos bancos alimentares. Também aí se explica a emergência de uma extrema-direita com apoio suficiente para conquistar assentos parlamentares. Razão para que um defensor da economia de mercado como Marcel Fratzscher, presidente de um dos principais think tanks de Berlim, condene a opção tomada pelos governos alemães nos anos mais recentes. Porque se o setor da economia dedicado à exportação funciona bem, com salários elevados e estáveis, o dos serviços caracteriza-se pelo contrário: produtividade baixa e remunerações irrisórias. Dessa polarização resulta que só uma parte da população beneficie com a aparente saúde financeira do país.
Infelizmente foi um “socialista”, Gerhard Schroeder, o arquiteto da mudança, que permitiu passar a taxa de desemprego de 12 para 6%, mas à custa de baixos salários e de precarização dos empregos. Que prejudicam, como de costume, as mulheres, que são as maiores vítimas desse estado das coisas.
Os chamados minijobs não só inibem, os que a eles são obrigados, de não reivindicarem melhores condições para os trabalhos executados, como nem sequer permitem descontos para se vir a ter futuramente uma pensão de reforma.
Marcel Fratzscher considera que os empregadores têm dificuldade em conseguir colaboradores qualificados e motivados se não lhes pagarem o suficiente para que se sintam com perspetivas de futuro e ao abrigo das dificuldades nele percetíveis. Por isso mesmo é um defensor do aumento significativo do salário mínimo, que desmente serem causa de perda de empregos: na realidade as empresas acumulam lucros excessivos, que tendem a não querer redistribuir por quem as integra. Por isso mesmo defende, igualmente, um escrutínio público aos administradores das empresas privadas, consoante atuam no sentido de uma maior ou menor diminuição das desigualdades sociais.
As conclusões a retirar deste retrato são evidentes:  é redondamente falsa a argumentação dos neoliberais segundo os quais os baixos salários criariam mais riqueza e empregos. E que obrigar quem trabalha a deveres exagerados para quase nenhuns direitos só poderá conduzir a péssimas consequências.

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