segunda-feira, 18 de julho de 2011

Contestações insuspeitas

Enquanto o governo de Passos Coelho ainda vai usufruindo de boa televisão, com um coro de entusiásticos apoiantes a vibrarem com cada uma das suas (raríssimas) decisões, os jornais já estão a retirar-lhe o estado de graça com que começou.
Um bom exemplo disso mesmo foi o que sucedeu com o jornal «i». Recentemente comprado por Jaime Antunes, viu-se dirigido desde então por António Ribeiro Ferreira, cujas diatribes fascistóides contra José Sócrates chegaram a raiar o insultuoso.
À luz desse passado ainda recente contaríamos vê-lo entre os ululantes defensores do novo Governo. Puro engano!
Basta pegarmos em duas das suas crónicas mais recentes para constatarmos quanto poderão sair da sua pena alguns dos mais violentos ataques jornalísticos contra a nova situação política.
Por exemplo no editorial do dia 15, ele escrevia a propósito do tão incensado Ministro das Finanças:
Vítor Gaspar fez questão de mostrar que afinal este novo imposto não vai ser muito violento para os portugueses. Isto é, o ministro das Finanças deixou a porta aberta para mais impostos em 2012 de modo a conseguir reduzir o défice para os valores acordados com a troika. O que Vítor Gaspar quis dizer afinal é que na sua opinião ainda não foi alcançado o tal limite a partir do qual não será possível pedir mais sacrifícios aos portugueses. (…)
Quando Vítor Gaspar afirma que Portugal vai sair da crise e triunfará no exacto momento em que anuncia mais um imposto violento, que retira metade do subsídio de Natal aos portugueses, só pode estar a brincar. Com as pessoas e, já agora, com o fogo.
Convenhamos que é impossível discordar com o que ele escreveu. Porque, para além das suas olheiras e da sua suposta simpatia, o novo Ministro está determinado a levar por diante a transformação da economia nacional num campo de experiências para as suas idolatradas teorias miltonfriedmanianas, que tão mau resultado deram aonde foram aplicadas.
Já hoje, o mesmo Ribeiro Ferreira dirige a sua aspereza para com o sector financeiro responsável pela crise actual, quase se confundindo nos argumentos com a esquerda mais radical: Os miseráveis que provocaram esta tormenta continuam de pedra e cal à frente de bancos, empresas e instituições e, como não podia deixar de ser, estão cada vez mais ricos e poderosos. Há crimes mas não há responsabilização, não há castigo. (…)
Numa altura em que se pedem auditorias a tudo e mais alguma coisa, seria interessante perceber o que fizeram os sucessivos governos dos camiões de dinheiro recebidos de Bruxelas desde a adesão, em 1986.
Outro colunista do mesmo jornal em quem suspeitávamos de simpatias esquerdistas é Tomás Vasques, que escreve um texto muito crítico em relação ao actual governo: O que nos deve preocupar seriamente é, em primeiro lugar, a visão deste governo ao fazer incidir este imposto extraordinário sobretudo nos rendimentos do trabalho; em segundo lugar, não ter até ao momento conseguido elaborar uma proposta séria de redução das despesas do Estado, reduzindo-se ao folclore que condenava ao anterior governo: a de tirar a gravata para poupar energia entrou já no anedotário político e na piada de café.
O ministro das Finanças não explicou cabalmente, titubeando nas
respostas, a razão pela qual se excluíram deste esforço nacional os lucros das empresas e os rendimentos de capital, quer sobre dividendos, quer sobre juros de depósitos, não dividindo assim o mal pelas aldeias e, consequentemente, sobrecarregando o esforço exigido a quem trabalha. (…)
A conclusão óbvia sobre a decisão deste governo quanto a a incidência deste imposto recair principalmente sobre os rendimentos do trabalho e isentar do esforço nacional os lucros das empresas e os rendimentos de capital, é a subordinação à sua cartilha ideológica, segundo a qual se atribui aos custos do trabalho e à protecção legal de quem trabalha, consagrada no Código do Trabalho, a fonte de todos os males que impedem o crescimento económico. Esta visão, que protege os lucros das empresas e os rendimentos do capital, massacrando os fracos proventos de quem trabalha, conduz-nos, seguramente, a uma desgraça muito maior do que aquela em que estamos. Ir buscar dinheiro, para atingir as metas da consolidação orçamental, a quem ganha 600 ou 700 euros por mês e deixar de fora lucros de empresas e de rendimentos de capital de milhões euros é, no mínimo, um desvio colossal.

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