domingo, 21 de abril de 2013

INDIE 2013: «Lacrau» de João Vladimiro

Nos tempos idos do milénio transato, quando o meu ofício era andar de oceano em oceano, tive um comandante com gostos cinéfilos bastante definidos: o que ele mais apreciava eram os filmes do «sigal», do «vandame», do «chuquenoris» e do «chevarzenega»! E os motivos eram fundamentados: tinham de ter «muita porrada e gaijas boooas!».
Enquanto assisti a este filme do João Vladimiro pensei em qual seria a reação dessa singular personalidade se estivesse ali na plateia da Culturgest, já que qualquer semelhança entre «Lacrau» e aquele tipo de filmes é … nenhuma. O mais certo seria uma de duas possibilidades: ou adormeceria profundamente, acordando mais ou menos estremunhado, quando a banda sonora batesse no patamar superior dos decibéis suportáveis pelos ouvidos humanos, ou sairia escandalizado perante o encargo com este tipo de filmes para os contribuintes .
E, no entanto, apesar dos meus gostos cinéfilos serem totalmente opostos ao de tal episódico co-tripulante da mesma nave, não consegui gostar do filme do João Vladimiro. Não adormeci (por pouco!), nem saí da sala, mas também não encontrei motivos para elogiar a obra em causa.
Por norma costumo dizer que gosto de obras que me inquietem, impressionem ou encantem. «Lacrau» teria condições para se perfilar no primeiro tipo ao promover uma viagem sonora e mística pelo campo ainda habitado, pelo campo desabitado e pela cidade esquizofrénica (explicação do realizador na conferência subsequente à exibição), mas para além de muitos fotogramas interessantes, que por si sós valeriam como obras fotográficas esteticamente apelativas, incomoda a falta de racord entre cenas, a indefinição quanto a um guião estruturado que acabou afinal por ser definido apenas na fase da montagem, e a tentativa de caução de um misticismo do realizador, que me é totalmente indiferente tendo em conta o meu ateísmo quase fundamentalista.
Ainda pus a questão de me separar da estética de Vladimiro o hiato geracional, dos vinte anos que nos deverão separar. Mas quero crer que nem esse argumento chega a aguentar-se tendo em conta a consonância no fascínio por algumas tradições rurais em vias de extinção e cuja perenidade só a passagem a filme poderá garantir.
Mas significa isto, que a experiência não valeu a pena? Pelo contrário: «Lacrau» não deixa de desafiar-nos na assumida rutura com os cânones do cinema comercial. Por isso, mesmo não gostando, confesso que a sua visualização mereceu bem a deslocação...

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