terça-feira, 18 de junho de 2013

DOCUMENTÁRIO: «De Cézanne à Bonnard. L’Atelier du Midi» de Florence Mauro (3)

No início do documentário vemos um idoso a sair das águas do Mediterrâneo. Está-se em 1946 e quem acaba de tomar mais um banho de mar é Bonnard, um pintor para quem o Midi significou o espaço de afirmação de uma viragem estética na sua pintura. Mesmo que, mais do que paisagista. O fascinasse o corpo desnudado de Marthe, a sua mulher e musa, que ele costumava fotografar na viragem do século e depois não se cansaria de pintar nas décadas seguintes.
Mas o interesse pelo Midi vem de muito antes, mais precisamente dos anos oitenta do século XIX, quando Cézanne pintava as paisagens dominadas pelo Monte Sainte-Victoire com o prazer de experimentar as relações entre tons para ilustrar a luz especial, com que se deleitava, e livrando-se do recurso á encenação do seu motivo.
Para Cézanne a luz do Midi não tem paralelo em nenhuma outra e incita os amigos a confirmá-lo. Renoir e Monet viajam pela costa mediterrânica com o pintor dos nenúfares a espantar-se com lugares, que considera feéricos.
Van Gogh também escolhera a região procurando um mundo paradisíaco que o aproximasse o mais possível da ambiência japonesa de que se encantara através das respetivas estampas.
Artista esforçado, van Gogh faz imensas caminhadas para se inspirar com novos motivos para as suas telas acumuladas no pequeno quarto da Casa Amarela de Arles. Nas suas cartas o pintor holandês esclarece que a paleta de cores a utilizar ali nada tem a  ver com a usada a norte.
Ele aspira criar uma comunidade artística em seu torno para o que conta com amigos como Gauguin ou Bonnard. Mas, a contragosto, o futuro habitante da Polinésia vai passar uns dias com o amigo e a relação entre ambos atinge uma tal tensão, que a expetativa de formação do tal Atelier Artístico morre ali mesmo.
Depois da consagração de Seurat e de Signac no Salão dos Independentes de 1890, o segundo muda-se com a sua companheira Berthe para o sul ao verificar-se a morte precoce do primeiro. O pontilhismo era, então, uma proposta estética progressista consistente com a crença dos seus cultores em como as transformações sociais e políticas acompanhariam inevitavelmente as evoluções científicas.
Dérain, outro dos que se rende ao fascínio do Midi, compreende quão forte é a luz, ao ponto de quase anular as sombras. Novidade que o desconcerta, mas  não o suficiente para lhe bloquear a descoberta das intensas emoções suscitados pelo espírito do lugar.
Matisse também se vai interessar pela pureza das cores e pelos efeitos de vizinhança entre elas, ao mesmo tempo que abandona a função dos contornos traçados pelas linhas. Em definitivo as cores sobrepõem-se à forma.
Braque chega à região a convite de Dérain e transforma a paisagem em função da estética cubista de que era um dos principais cultores.
A abstração começa a instalar-se com progressiva relevância tendo Bonnard como um dos seus defensores: a paisagem surge a partir do que se vislumbra para o exterior das janelas dos interiores aonde situa os seus motivos, mas vai-se indefinindo como se ele e Marthe se fossem dissociando cada vez mais da realidade circundante.


Sem comentários:

Enviar um comentário