segunda-feira, 21 de outubro de 2013

FILME: «Orléans» de Virgil Vernier (2012)

À partida Virgil Vernier estava decidido a rodar uma curta-metragem, o que explica o facto de «Orléans» ter sido rodado em apenas quatro dias e meio.
A ideia era centralizar o filme nessa cidade do sul de França recorrendo às mitologias das mulheres guerreiras, nomeadamente através das cerimónias aí prestadas a Joana d’Arc desde há cerca de seiscentos anos e compostas de missas, procissões e imitações em carne e osso.
Foi durante as audições das candidatas ao papel da célebre heroína, que Vernier sentiu vontade em ficcionar uma história de destinos trágicos passada nessa cidade.  Daí a opção pelo clube de strip onde duas personagens, Joana e Sílvia, procuram seduzir clientes estimulando-os a pagarem-lhes bebidas, e a trocarem conselhos e truques enquanto retocam as maquilhagens na casa de banho.
Aos vinte anos, Joana sonha ir para Paris coreografar números em dança jazz, mas a realidade torna-a pragmática sem a despojar da candura, aceitando as relações de poder e de negócio com um desprendimento aparente. Depois seguimo-la no seu passeio pelas ruas da cidade, que a levam a cruzar-se com a rapariga escolhida nesse ano para, a cavalo e com armadura, personificar a figura mitológica a incensar.
Para conseguir o papel de Joana, a atriz Andréa Brusque apresentou-se nas audições como stripper profissional, fazendo uma demonstração tão convincente, que Vernier não teve dúvidas em contratá-la, só sabendo, dias mais tarde, ter sido enganado.
Para além de uma transposição moderna do mito de Joana d’Arc, «Orléans» faz o paralelo entre a bailarina acossada nos labirintos da lubricidade marginal e a heroína decidida a dali sair para salvar o reino francês.
Explica Vernier: “questionei-me sobre o que iria na cabeça de Joana d’Arc quando decidiu sair da sua terra natal. Que fantasma a terá invadido ao ponto de, como que possessa, deixar de ter medo do que quer que fosse, que nada parecesse demasiado grandioso para que se sentisse intimidada.
Como Joana que nela se projeta, também a personagem homónima desejaria conseguir centrar em si a atenção de toda a cidade
«Orléans» não tem propriamente um argumento. Mais do que pôr a história no papel, o realizador contentou-se em imaginar um conjunto de sequências com lugares, pessoas e atitudes, que desejaria filmar.
Cada cena era isolada do resto do filme e podia durar uma hora. O mais difícil seria depois reter nela o momento certo e encontrar-lhe coerência com o resto do projeto.
Virgil Vernier assina aqui a sua terceira longa-metragem, mas a primeira de ficção, já que rodara anteriormente dois documentários: «Chroniques de 2005» (2007) e «Comissariat» (2010).
O que singulariza «Orléans»  é a mistura de estratégias narrativas que, no papel pareceriam dissonantes, mas em filme acabam por funcionar. O universo noturno já era um território preferencial,  mas a luz do dia é aqui igualmente importante.
Temos, pois, uma história sobre a persistência ao longo dos séculos da eterna juventude e da humilhação das mulheres sacrificadas.



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