quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

IDEIAS: da Liberdade formal à Liberdade real

Rousseau não se cansa de defender a necessidade de uma sociedade desejosa de restabelecer a igualdade natural. Por isso defende que importa substituir a sociedade civil - espaço de trocas, de necessidade e de desigualdade - por uma sociedade conforme com o contrato social.
Nesta sociedade política, cada cidadão decide abandonar a sua vontade particular e a satisfação dos seus interesses individuais para os fusionar nessa vontade coletiva, que exprime a lei.
A lei, pelo seu carácter abstrato, formal e universal, implementa a igualdade perdida com o advento da sociedade civil. Por definição, a lei impõe-se por igual a todos os cidadãos. Oriunda da vontade coletiva, surge ao cidadão como a expressão da sua própria vontade. Obedecendo à lei ele obedece a si mesmo e não se insere em nenhum esquema de sujeição.
A renúncia ao interesse particular em proveito do interesse coletivo é frequentemente interpretado como uma limitação à liberdade individual. No modelo de Rousseau o individuo desaparece no corpo social. A sociedade torna-se numa comunidade e deixa de constituir um mercado. A perda de alguns privilégios individuais será o preço a pagar pela restauração da igualdade entre os homens. Para Rousseau a igualdade é um requisito indispensável ao verdadeiro exercício da liberdade.
De facto, os homens não serão verdadeiramente livres se não se libertarem de todas as formas de sujeição. Enquanto existirem desigualdades os mais favorecidos oprimirão a liberdade dos mais desvalidos.
Rousseau teve em conta a sua própria experiência enquanto valete de Mlle de Lambercier, quando, segundo conta nas suas «Confissões», foi injustamente acusado de lhe partir o pente. A desigualdade leva os humildes a suportarem a injustiça e a violência dos poderosos sem se poderem defender.
Desse ponto de vista, o «Contrato Social» coloca as primeiras pedras do ideal socialista, a exemplo do que Jaurès exprimirá em «Socialismo e Liberdade»: todos devem ter uma parcela do direito e do poder político para que na Cidade nenhum homem seja a sombra de outro homem, a fim de que a vontade de cada um integre a direção do conjunto e que, nos movimentos mais vastos das sociedades, o indivíduo  reencontre a sua liberdade.
O ideal socialista nasce da constatação da interligação entre a injustiça social e as desigualdades entre os homens que compõem essa sociedade. Só alguns privilegiados usufruem plenamente a sua liberdade, enquanto os outros só veem na liberdade uma simples faculdade da sua consciência.
Mas a liberdade do foro interior não compensa a que se é negada diariamente nas relações sociais. O socialismo começa sempre por ter uma perspetiva desaprovadora sobre a sociedade.
Ao primeiro movimento de contestação sucede-se um outro, positivo, que procura os meios para transformar esta sociedade considerada inaceitável.
Proudhon vê na Ciência e nos progressos técnicos o melhor agente da mudança e, desse ponto de vista, ele não difere muito do ideal socialista de Saint-Simon. Será, aliás, um discípulo de Saint-Simon, que inventará, em 1832, o neologismo “Socialismo”. Por isso, no final desse século, Émile Littré poderá defini-lo assim:  Socialismo é o sistema que, mediante reformas políticas, oferece um plano de reformas sociais.
O socialismo não é, pois, hostil à liberdade individual. Pelo contrário: da sua ação resultará a sua satisfação plena. Mas, em nome do princípio da igualdade, denuncia a diferença entre uma “liberdade formal” correspondente à prevista na Declaração dos Direitos Humanos, e a “liberdade real”, verdadeiramente apostada em reduzir o mais possível as diferenças entre os homens...


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