domingo, 15 de fevereiro de 2015

Quem se vai desviar?

No excelente blogue «Ladrões de Bicicletas», o prof. José Castro Caldas lembra o «jogo do cobarde», que é um dos mais glosados exercícios praticados na Teoria dos Jogos que tem em Ianis Varoufakis um dos mais conceituados especialistas. Aproveitemos a descrição, por ele feita no seu texto:
“Dois automobilistas, ao volante de carros de grande cilindrada colocam-se frente-a-frente numa estrada. Aceleram em rota de colisão. Se nenhum se desviar, embatem em choque frontal. Ambos perdem, possivelmente morrem. Se apenas um se desviar, ambos sobrevivem, mas o que se desviar perde. Se ambos se desviarem, ambos sobrevivem.”
Essa é uma situação, que se ajusta bem a quanto se passa hoje na Europa: por um lado temos um automobilista alemão, a quem gente muito conceituada - nomeadamente alguns dos mais prestigiados economistas galardoados com o respetivo Nobel - já avisaram não ir dar a parte alguma a estrada em cuja direção quer acelerar. Do outro lado, vem o automobilista grego, assustado com tudo quanto viu no que deixou para trás e decidido a afastar-se tão rápido quanto possível de tal inferno.
Quem é que vai desviar-se do embate certo? A maioria dos comentadores, que criaram raízes nas nossas televisões e imprensa escrita apostam nos gregos. Até porque, di-lo Ricardo Costa num texto ontem publicado no «Expresso», o condutor alemão tem o pendura espanhol a azucrinar-lhe os ouvidos para acelerar sob pena de vir a confrontar-se proximamente com um segundo carro em sentido contrário. E, podemos acrescentar que, encolhido no banco de trás, o pendura português está de cabeça perdida a gritar “Acelera! Acelera!” sem saber bem porquê!
Mas se olharmos para ambos os condutores há algo que claramente os distingue: enquanto o grego ostenta a calma de quem sabe racionalmente não ter outra solução senão a de seguir em frente, o alemão vai suando de medo, porque as dúvidas já o assaltam.
«E se eles têm mesmo razão?», eis o pensamento incómodo, que lhe provoca terrível enxaqueca. Porque vê-se com o dilema do cristão que, à hora da morte, vai ouvindo o padre dar-lhe a extrema-unção e, desesperado pensa pela primeira vez na possibilidade de nada haver do outro lado.
Confio que, no último instante, se ouça uma guinada para a esquerda e o carro grego prossiga no caminho, enquanto, parados na berma, o alemão, o espanhol e o português ficarão subitamente calados perante a enormidade do desafio, que passarão a enfrentar daí para a frente: abjurarem todas as certezas e descobrirem o surgimento de um tempo novo em que a Democracia se volta a sobrepor aos dogmas a que tinham entregue as atormentadas almas...

Sem comentários:

Enviar um comentário