quinta-feira, 18 de junho de 2015

A racionalização dos recursos do Estado

1. Vi pouco referenciada nos demais media a entrevista dada por António Costa ao jornal «Público» de ontem.  Parece que está em marcha um plano de silenciamento sobre as propostas do próximo primeiro-ministro tendo por objetivo dificultar ao máximo uma mudança de políticas, que a maioria dos portugueses sente como imprescindível.
Se as diversas páginas dessa peça jornalística têm interesse no seu todo, escolho como extrato merecedor da mais ampla divulgação a intenção de António Costa em pôr fim à enorme sangria de recursos do Estado com gabinetes de advogados e empresas de consultoria contratados em regime de outsourcing para apoiar a administração pública nos seus mais variados projetos. Diz o secretário-geral do PS:
O Estado não pode continuar a não ter recursos próprios nas competências jurídicas para a negociação de grandes contratos, tendo de recorrer, sistematicamente, à requisição, em outsourcing de escritórios de advogados ou de analistas financeiros. Isso fragiliza a proteção do interesse público e torna aqueles que servem momentaneamente o Estado mais permeáveis à influência, normal, da atividade que desenvolvem noutras circunstâncias para os seus clientes privados
(…) A administração pública durante muitos anos tinha dos melhores quadros nos mais diferentes domínios. A política de sucessivas décadas de descapitalização dos recursos humanos foi enfraquecendo a capacidade do Estado. E o Estado acabou por fazer mais o outsourcing das funções onde se requer inteligência  do que nas funções relativamente indiferenciadas onde até fazia mais sentido ter recorrido aos serviços privados. Um motorista, teoricamente, não tem de ser um funcionário do Estado. Mas os técnicos que apreciam o contrato de uma concessão de uma autoestrada, ai, isso tem todas as vantagens que não estejam momentaneamente a trabalhar para o Estado [mas sim a trabalhar em permanência]. Por mais sérios que sejam, é uma questão de princípio.”
2. A história da privatização dos Estaleiros de Viana do Castelo  é exemplo lapidar de como o conceito de racionalização dos recursos do Estado teve neste (des)governo uma versão muito sui generis.
Recordemos que, apostado em entregar aquela empresa ao grupo Martifer, aguiar branco tudo fez para lhe acelerar o fim. Para tal não hesitou em cancelar a encomenda de dois navios-patrulha para a Armada portuguesa, depois de terem sido entretanto construídos e entregues outros dois. Decisão complementar foi a de garantir que a Administração para ali nomeada não mexesse uma palha na busca de novos clientes, que proporcionassem negócios passíveis de viabilizar os Estaleiros.
Agora que o crime já se consumou, aguiar branco retomou a encomenda em ajuste direto à Martifer dos dois navios-patrulha anteriormente cancelados. Valor do negócio a embolsar pelos donos da empresa: 77  milhões de euros.
Quer o PS, quer o PC, prometem não deixar o assunto ficar-se por aqui. É que o desplante do ministro, e de quem com ele negociou uma privatização mais do que duvidosa, merece ser contrariado, esclarecendo-se, em simultâneo, a forma como tudo isso foi possível...

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