sábado, 30 de abril de 2016

A explicação para uma tão longa noite

Há cerca de um mês a Associação Gandaia (da Costa da Caparica) organizou um encontro com Fernando Dacosta em que esteve muito em causa o que era o salazarismo. E alguém na assistência questionava o escritor sobre uma preocupação que, há muito, o acompanhava: como foi possível que um regime assim durasse tantos anos?
Se o convidado fosse outro Fernando, mas de apelido Rosas, a resposta seria fácil de dar, porque o historiador jubilado esta semana andou anos e anos a estudar essa questão e a encontrar-lhe respostas, hoje tidas como incontestáveis para quase toda a gente à exceção do núcleo de revisionistas, que insistem em apagar os efeitos mais criminosos do regime e sugerir que se tratava de um conservadorismo algo musculado.
Nestes últimos anos tem sido dada exagerada importância a sucessivas publicações de estudos de gente ideologicamente de direita, que procura dar continuidade ao legado do sinistro José Hermano Saraiva e que tem em Rui Ramos um dos seus principais mentores. E, por uma razão bastante evidente: da forma como a História for lida, assim se pode influenciar num ou noutro sentido a evolução política do presente. Porque o cavaquismo, à pala do qual muitos desses manipuladores têm singrado, mais não constituiu do que uma adaptação de muitos dos valores salazaristas a uma conjuntura onde eles dificilmente conseguem ser aceites. Mas sempre com o mesmo objetivo: garantir uma paz podre para benefício dos empreendedores (sobretudo os do tipo BPN) criando todas as condições possíveis para impedir qualquer veleidade de contestação social.
Daí o afã em dar importância a um Conselho de Concertação Social onde os patrões dominam em número e influência e à UGT está destinado o papel dos antigos Sindicatos Nacionais do período salazarista, que só tinham de acrescentar a assinatura ao que o Ministro das Corporações impusesse.
Para os “historiadores” com poiso garantido no «Sol» ou no «Observador» a intenção é normalizar o regime anterior a 1974 e fazer acreditar que estamos a sofrer os efeitos da “nefasta” Revolução de Abril, que ousara destruir o “equilíbrio” e relação de forças, que imperara até então. O tal país no diminutivo onde juizinho é que era preciso!
A importância do contributo de Fernando Rosas como historiador assusta os que apostam na substituição do capitalismo keynesiano por uma nova ordem, que teve nos quatro anos da governação de Passos Coelho e Paulo Portas algumas das suas principais características: a redução do Estado ao mínimo e a privação de direitos a quem trabalha ou trabalhou.
Numa altura em que a direita pretende escamotear as batalhas ideológicas que determinam, atualmente, o futuro que virá, olhar para a História numa perspetiva objetiva e racional como o tem feito Fernando Rosas ou deturpadora do que a tem caracterizado, decorre desse combate, que as esquerdas plurais não podem perder. Mais: que as deve cimentar na matriz que as está a fazer impedir o retrocesso social e económico, que a direita trataria de retomar.
Por tudo isso Fernando Rosas é um dos nossos melhores historiadores contemporâneos e deveria ser merecedor de todos os Prémios, que Pacheco Pereira sugeriu, mas que lhos não atribuirão. É que, a começar no Prémio Pessoa, como seria possível ao seu principal patrocinador, Balsemão, consagrar tudo aquilo que os seus jornais, revistas e televisões fazem por evitar?


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