domingo, 22 de maio de 2016

Ressabiado e desafinado me confesso!

Eu sei que alguns dirão: “cá está outra vez o ressabiado a falar!” E é verdade: eu ressabiado me confesso!
Passará muita água debaixo das pontes até conseguir aceitar que o eleitorado português tenha desperdiçado a oportunidade de ter como Presidente uma personalidade da dimensão ética e cultural de António Sampaio da Nóvoa. É que ele seria mesmo um Presidente com p grande, enquanto Marcelo nunca passará de um presidente com um p bem pequeno. Em primeiro lugar pela forma fraudulenta como conseguiu tornar-se presidenciável: planear intervenções semanais nas televisões durante anos até estar convencido da forte probabilidade de vencer denuncia um tipo de calculismo, que tem muito mais  a ver com a relevância dada à satisfação do ego do que propriamente à prioridade dada ao que mais interessaria aos portugueses. Tivesse António Guterres concorrido e nunca ele compareceria para perder!
Há, porém, o outro lado que Marcelo representa e sempre virá ao de cima: nunca deixará de ser quem é! Ou seja, o mesmo beato que travará os avanços civilizacionais em questões tidas como proibidas para a igreja - se, no passado esteve entre os que pretendiam travar a lei do aborto, pronuncia-se agora com um provável veto na das «barrigas de aluguer» e por certo tudo fará para impedir a aprovação da «morte assistida».
 No entanto, quando já lança para os jornais a possibilidade de vetar a aplicação das 35 horas à Função Pública, talvez abra os olhos aos comunistas que nele votaram - e assim lhe possibilitaram a passagem à 2ª volta! - continuando a ser dos que, nas sondagens, mais lhe garantem a elevada popularidade.
Ingénuos, que são, continuam embalados pela artimanha dele em ter comparecido duas vezes na Festa do Avante e ter disso feito abundante publicidade!
Ao vetar esse horário de trabalho, Marcelo quererá iniciar o distanciamento do governo, que se tornará mais óbvio quando contar no PSD com um líder mais a seu gosto. Nessa altura, aqueles que verberaram em Cavaco o facciosismo a favor dos seus apaniguados, talvez se surpreendam pelo facto desse tipo de atitude - mesmo que expressa de forma mais inteligente! - não constituir traço de carácter exclusivo do filho do gasolineiro de Boliqueime.
Já se adivinham os opinadores do costume a masturbarem-se intelectualmente com o dilema: dará António Costa satisfação a Marcelo ou ao PCP? Arriscará a crise política e a queda do governo ou voltará a “revelar-se nas mãos dos comunistas”, denotando assim a sua “fragilidade”?
Marcelo sabe bem que António Costa tem capacidades de negociação  fundamentais para garantirem a sua resiliência à frente do Governo, mas também é suficientemente arguto para concluir que o combate a ele só poderá resultar através das tentativas de lentamente criar as condições para desmoronar os apoios em que ele se sustenta. Não é com uma grande vaga, que derruba o Costa, mas com pequenas e sucessivas ondas destinadas a enfraquece-lo na medida do possível!
O resultado adivinha-se: se vetar ambos os diplomas, eles voltarão à Assembleia e a maioria dos deputados aprová-los-ão. Mas os suspeitos do costume andarão semanas a conjeturar sobre o fim da coabitação pacífica e tentarão convencer os incautos quanto a António Costa estar mais enfraquecido, mais próximo de voltar a entregar o pote à direita como eles tanto suspiram!
Sei que alguns responderão a este texto a dizer que sou um desafinado, porque ele até “tem feito quase tudo bem!”. Mas ressabiado e desafinado com o coro dos marcelistas me reafirmo. Porque como concluía a canção de João Gilberto: “Que no peito dos desafinados/ Também bate um coração!”

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