sábado, 3 de março de 2018

O novo emprego de Passos Coelho não nos deve apenas indignar

Estes últimos dias têm sido de grande focalização noutros estímulos, que não os da política quotidiana, pelo que terei deixado passar alguns temas merecedores de abordagem, mas entretanto tornados obsoletos pela vertigem com que se sucedem os acontecimentos.
Desperto para o dia, quando as redes sociais manifestam uma indignação generalizada com a contratação de Passos Coelho pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, equiparando-o a professor catedrático.
Confesso que, de início, a notícia me colheu de surpresa. Se se sabia que Passos Coelho teria a lata de, sendo um comprovado cábula, dar aulas numa ou mais universidades, julgara que estas seriam privadas e obedeceriam aos ditames dos seus proprietários. Adivinharíamos a falta de qualidade das aulas aí ministradas, mas nada teríamos a ver com isso, porquanto os alunos e os papás, que lhes pagam as propinas, sabem ao que vão, quando com elas se comprometem.
Convenhamos que, com os meus impostos, estar a contribuir para o ordenado de Passos Coelho, é motivo de enfática indignação, que justifica ruidoso protesto. Mas, uma vez mais, não deixa de ser esclarecedora a personalidade do novo «professor» (sim, com aspas, porque considera-lo enquanto tal, constitui um insulto aos que verdadeiramente o são!), que andou anos a fio a criticar os que se acolhem à sombra do Estado e logo os imita tão só disso tem oportunidade. O menos Estado que reivindicava para os outros, torna-se assim em Estado farto quando se trata de si.
Sabemos que o Ensino Superior goza da autonomia conquistada à custa de lutas de sucessivas gerações, mas esse estatuto torna-se numa caricatura, quando serve para Reitores e Conselhos Científicos promoverem e avalizarem uma situação como esta. Estará na altura do Ministério da tutela impor algumas regras básicas como a da obrigatoriedade do doutoramento para se ser professor universitário, e estar-se a prepará-lo para se ser aceite como assistente. Exceções só devidamente fundamentadas e aprovadas por essa mesma tutela. Será uma regra deste tipo tão gravosa para com essa tal autonomia?
Mas - e essa leitura ainda a não vi fundamentada por quem se mantém apenas na fase de indignação! - há outra explicação para que Passos Coelho vá dar a sua perspetiva ideológica sobre a Administração Pública aos pobres alunos, que lhe calharem por azar: a exemplo do controle dos meios de comunicação social - quase exclusivamente concertados no combate ativo à atual solução governativa! - as direitas também sabem garantir o seu seguro de vida se mantiverem o controlo ideológico das universidades. Os atuais «jornalistas» e «comentadores económicos», que se revezam nas críticas ao governo, saíram todos do alfobre de cursos universitários ideologicamente orientados para as mesmas idiossincrasias, invariavelmente caracterizadas pelo horror com que leem o que possa cheirar a socialismo e descortinando falsos paraísos nas soluções neoliberais de que se tornaram ativos porta-vozes.
Quando aqui se tem defendido a necessidade de uma barrela eficaz sobre toda a comunicação social  de modo a depurá-la dos valores e conceitos falaciosos, que visam manter o atual estado de desequilíbrio entre o Capital e o Trabalho, essa limpeza também importa estender às Universidades do Ensino Público para que as novas gerações de licenciados, a integrarem a tal Administração Pública, surjam libertos das formatações com que Passos & Cª tentarão programa-los.


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